domingo, 8 de abril de 2012

#01

É como andar no Sol e não sentir o calor.

Talvez seja uma definição estúpida, que nada acrescenta ou esclarece, mas é o mais próximo que se pode chegar da realidade. Como pode alguém ter absoluta certeza que os raios tocam a sua pele e, ainda assim, não sentir o efeito mais básico? 

A primeira vista, obviamente, seria fácil apontar o receptor como culpado. Ele tem problemas, por isso não o sente. Então, ainda que contrariado e decepcionado consigo, ele tenta todas as medidas possíveis e imagináveis. Aos poucos, porém, começa a perceber que isso é algo que se refere apenas ao Sol: ele sente a chuva, sente o frio e para o seu total desespero, consegue sentir o calor de qualquer outra fonte – exceto do Sol.

Então, qual é o problema? Ele imagina sentir, sempre que sai a luz do dia, faz um esforço incansável para se lembrar de como era a sensação, algumas vezes até se convencendo que está sentindo, mas não esta. O tempo, que passa sem dó, faz com que ele se isole, trocando o contato pela observação, já que todos os dias, passa horas olhando a luz que traz o Sol, o seu contato nos outros, o seu brilho intenso.

Inveja, raiva, desespero. São tantas coisas para sentir, seu corpo em total frustação, sentindo o mais intenso ódio daqueles que, ao contrário de si, podem ter aquele toque morno. E pensar que ele nunca fez questão de sentir...

Ainda que as vezes desista, que passe o dia repetindo que aquilo é bobagem – afinal, ele não tem o Sol, mas tem todo o restante -, em tantos outros só consegue ficar ali, parado, desejando o que não tem. Esquece-se da vida, nem ao menos se lembra de todas aquelas sensações tão intensas que vinham de outras fontes, que lhe faziam bem.

E ele só queria sentir o calor do Sol...

Talvez fosse o momento de ele entender que o Sol não é seu, e nunca foi; que aqueles que sentem o calor proveniente deles, merecem tal condição e que ele, tão indiferente, perdeu a sua chance de viver com algo que lhe fazia bem, ainda que nunca tenha observado isso. O Sol, o seu Sol, pode ter escolhido aqueles que deseja tocar, e para o seu azar, ele não estava incluído nos merecedores. Seria justo, ele precisava admitir. É claro que entender o quanto isso era justo em nada auxiliava em domar a falta que sentia, a necessidade, mas tornava a raiva mais racional.

Por fim, em ato total de desespero, deixa de olhar para o Sol. Não pensa mais quando caminha e não o sente, controlando cada batimento do coração, a sua ansiedade, a sua solidão. O Sol o abandonou, talvez consciente, talvez não, precisa aceitar. Como ato de despedia, buscou um lugar calmo, solitário como ele, e deitou no chão – como último ato para que o Sol mostrasse que ele estava errado. Mas o Sol se manteve como sempre: lá, distante, aparentemente inocente, quem sabe até sem notar o que estava fazendo. Como última atitude, ele simplesmente chorou, por dentro com a esperança de que o Sol secasse suas lágrimas, mas elas apenas se perdiam por seu rosto. Estava sozinho. Os raios ignoravam a sua pele. Eram as suas lágrimas de despedida – sempre sentindo sua falta, mas consciente de seu abandono.